Em apenas seis anos, o número de adolescentes em privação e restrição de liberdade aumentou 58,6% no Brasil. De 16.940 jovens cumprindo alguma medida socioeducativa desse tipo em 2009, o índice passou para 26.868 em 2015. Desse total, 18.381 jovens estão em medida de internação (68%), 2.348 em regime de semiliberdade (9%) e 5.480 em internação provisória (20%). Outros 659 adolescentes estão em atendimento inicial, internação sanção ou medida protetiva (medida socioeducativa suspensa para tratamento em clínica de saúde).
Dos 26.868 jovens, 9.918 estão no estado de São Paulo, que também possui o maior número de unidades – 150 de um total de 484, sendo 418 exclusivamente masculinas, 37 femininas e 29 mistas.Em seguida vem o Rio de Janeiro, com 2.235 pessoas, e Minas Gerais, com 1.963. Na situação oposta, Roraima tem a menor quantidade, somente 57 jovens, e possui apenas uma unidade.
Os dados integram o Levantamento Anual do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), divulgado pela Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente do Ministério dos Direitos Humanos (SNDCA/MDH). Embora a Lei Federal 12.594/2012 determine a publicação anual das informações, o governo Temer divulgou, no último dia 16 de janeiro, os dados referentes ainda ao ano de 2015.
“Esse atraso já é um problema grave, mostra a falta de prioridade deste governo com as políticas para crianças e adolescentes, a incompetência em tratar do tema”, afirma Ariel de Castro Alves, coordenador da Comissão da Criança e do Adolescente do Conselho Estadual dos Direitos Humanos de São Paulo (Condepe). Além do atraso, ele também critica a ausência dos índices de reincidência, o que impede a avaliação do trabalho e da eficácia das medidas socioeducativas aplicadas no Brasil.
Para o coordenador da Comissão da Criança e do Adolescente do Condepe, o aumento do números de jovens cumprindo medidas de privação ou restrição de liberdade revela a precariedade nos atendimentos e das políticas públicas para crianças e adolescentes, o que inclui a falta de oferecimento de cursos profissionalizantes, estágios e bolsas de estudo. Por outro lado, Castro Alves avalia que o aumento pode também ser consequência do recrudescimento do clamor popular por punição. “Tudo isso acaba gerando pressão no judiciário e colaborando para o aumento dos jovens internados.”
O representante do Condepe defende que a medida de semiliberdade deveria ser mais utilizada em relação aos outros dois tipos restritivos. “A internação deveria ser a excepcionalidade e não é isso que acontece”, lamenta.
Atos infracionais
Com 49%, os atos análogos a roubo e furto são a principal causa que leva os adolescentes a cumprirem medidas socioeducativas em unidades de internação. A segunda causa são infrações análogas ao tráfico de drogas, com 24%. Já o homicídio é responsável por 10% dos crimes praticados (em 2010 era 14,9%), e o latrocínio por apenas 2% (chegou a 5,5% em 2010) – ao contrário do senso comum que acredita ser elevado o número de atentados contra a vida praticados por adolescentes.
“Os crimes patrimoniais têm relação com consumismo, com a propaganda, a valorização do ‘ter’ ao invés do ‘ser’ da sociedade capitalista”, analisa o coordenador da Comissão da Criança e do Adolescente do Condepe.
Perfil
Em relação ao perfil dos adolescentes e jovens em restrição e privação de liberdade, o último Sinase revela que 96% do total são do sexo masculino e 61% foram considerados negros ou pardos, enquanto o índice de brancos é de 23%, e 14% não tiveram registradas sua cor ou raça.
“Isso por um lado mostra a seletividade, o racismo dos policiais e do sistema judicial, mas também indica que negros e pardos estão mais expostos à violência e a criminalidade”, avalia Ariel de Castro Alves.
Do total de jovens cumprindo pena, 57% tem entre 16 e 17 anos, e 17% entre 14 e 15 anos. Neste recorte, chama a atenção que 23% dos internos tem entre 18 e 21 anos. “Isso demonstra que o adolescente é punido”, afirma o representante do Condepe, questionando o “mito” da impunidade que parcela significativa da sociedade tem com relação ao tema.
Mortes
O Sinase de 2018 revela que 53 adolescentes morreram, em 2015, dentro das unidades de atendimento socioeducativo. Foram 18 mortes (43%) registradas como “conflito interpessoal” e 11 por “conflito generalizado”. Os números são superiores ao ano de 2014, quando faleceram 48 jovens.
Para o advogado, o alto número de mortes demonstra a incapacidade do Estado brasileiro em garantir a vida dos adolescentes. “Se não garante a vida, será que garante a ressocialização e a educação?”, questiona.
sul21
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