segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

Usar polícia ao invés da inteligência: isso é Chapecó

"Que ingênuas são as pessoas que acreditam que o trabalho da polícia é ir apagar o fogo enquanto as políticas públicas municipais não dão conta de melhorar o inferno"


Acabo de ler a notícia de que em Chapecó a polícia decidiu que vai "acabar com a algazarra e o barulho na Avenida Getúlio Vargas", se referindo aos jovens que ficam nas margens da avenida com seus carros de som aos finais de semana, logo depois do centro.
Como é fácil usar a polícia para fazer aquilo que ela já sabe fazer de melhor: representar medo ao invés de segurança para as pessoas, como forma de coagir comportamentos que não tem vazão.
Difícil mesmo é viver em uma cidade que não oferece uma política pública de lazer para jovens adultos - e nem para adolescentes, e nem para crianças, porque afinal jogar um parquinho em alguns bairros não é oferecer lazer, é fingir que oferece.
Essa forma de ver a juventude da margem do centro como menos digna de ocupar o espaço público é herança histórica. Chapecó tem lei municipal que proíbe pessoas de tomarem bebida alcoólica no centro da cidade, a não ser, é claro, que estejam consumindo em estabelecimentos que inclusive ocupam a calçada, que é pública, para fazer comércio privado. No caso de estar consumindo nos estabelecimentos do centro, não tem problema ficar bêbado nas calçadas públicas, problema é só quando os jovens da margem do centro ocupavam esse espaço para fazer o mesmo.
Por isso eu digo, usar a polícia é fácil, fazer política pública que não é fácil. Pensar e planejar estratégias de melhorias não é fácil. Mas nosso prefeito e nossos vereadores foram eleitos para o trabalho difícil e intelectual, não pra colocar demandas de adultos jovens nas mãos da polícia, e lavar as suas próprias.
Nós já sabemos como termina a guerra entre polícia e juventude negra e pobre, que começou com a política de guerra as drogas: morrer gente dos dois lados sem resolver problema algum. Enquanto a polícia empreende esforços para apreender jovens facilmente substituíveis com drogas, fingindo ser para a segurança pública (de quem?); os grandes traficantes continuam até no Senado Federal, fazendo o "corre" de helicóptero.
Que ingênuas são as pessoas que acreditam que o trabalho da polícia é ir apagar o fogo enquanto as políticas públicas municipais não dão conta de melhorar o inferno. É como um pai que surra sempre o filho porque ele erra, sem mostrar uma alternativa de como poderia ser mais certo.
Já dizia Juan Coulter que "teu dever é lutar pelo direito, mas se um dia encontrares o direito em conflito com a justiça, lute pela justiça". Nem sempre o que é legal, é o justo.
Mas para uma cidade cuja população e governo e igreja em pleno século XX promoveu um linchamento, matando e queimando presos em praça pública, isso é mais importante ainda de ser frisado. Fazer o fácil via punição para meter medo ao invés de defender direitos e justiça, será lembrado amanhã pela história como incompetência, e como uma infeliz opção.
Nossos jovens curtindo um som e bebendo na rua não merecem polícia, merecem respeito da administração pública. Não são criminosos. Criminosos e criminosas estão tomando posse na câmara de vereadores, apresentando programa policial, e compondo secretarias municipais. Polícia neles vocês não querem. Por que será?
Lucas Guerra
Foto: RedeComSC

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